Voos no Brasil estão, atualmente, entre os mais pontuais do mundo; dizem os britânicos. A gente explica

Responda rápido: em qual aeroporto os voos são mais pontuais? Changi, o entreposto futurista de Cingapura; Paris-Charles-de-Gaulle, a porta de entrada da França; Heathrow (Londres), o mais movimentado da Europa; Atlanta (EUA), o mais movimentado do mundo, ou algum hub tupiniquim, como Congonhas e Guarulhos?

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Aeronave sobre um Auxílio de Navegação na aproximação final para pouso em Brasília (Foto: Fabio Maciel)

 

Cuidado para não queimar a língua. Em 2015, os dois aeroportos paulistas embarcaram e desembarcaram passageiros com mais pontualidade do que todos esses. Não só eles. Põe na lista também  Dubai, Frankfurt, Hong Kong, Sidney, Seul, ou qualquer aeroporto norte-americano: Dallas, Chicago, Los Angeles, Nova York… you name it!

Essa é a constatação do respeitadíssimo estudo da consultoria britânica Official Airline Guide (OAG), especializada em inteligência de mercado de aviação, da AXIO Group, com sede em Londres e escritórios nas principais capitais do mundo.

O relatório OAG Punctuality League 2015 – On-time performance results for airlines and airports, publicado em janeiro, considerou uma base de dados de 50 milhões de voos realizados por mais de 900 cias aéreas em mais de 4 mil aeroportos, o que a permitiu o rastreamento de cerca de 110 mil voos diariamente. Informações detalhadas das operações aéreas mundiais, viabilizadas, sobretudo, pelos dados aferidos pela provedora de informações de voos em tempo real Flight View, incorporada à OAG no início do ano passado.

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O relatório consolidou os registros de pontualidade dos principais terminais e cias aéreas conforme o índice OTP  (On-Time Performance): partidas e chegadas que ocorrem em menos de 15 minutos do horário previsto. Para 2015, a OAG abarcou, pela primeira vez, estatísticas relativas à aviação latino americana, cujas performances de pontualidade, ao que parece, andavam um tanto subestimadas.

A conclusão é a de que a navegação aérea brasileira figura em posição de prestígio no cenário mundial no que diz respeito ao assunto. Segundo o estudo, Congonhas é o segundo “megahub” mais pontual do mundo, com um índice OTP de 87,8%, seguido por Guarulhos, com 87,47% dos voos partindo no horário programado em 2015. Atrás apenas do Aeroporto Internacional de Haneda, em Tóquio, 91,2%.

Além dos “megahubs”, aeroportos de maior número de conexões no planeta, o estudo relaciona três categorias de aeródromos, conforme o número de passagens vendidas/ano: grandes (mais de 20 milhões), médios (entre 10 milhões e 20 milhões) e pequenos (menos de 10 milhões). Entre os grandes, Guarulhos se destaca mais uma vez.  O terceiro mais pontual do mundo, atrás apenas de Munique, Alemanha, e, mais uma vez, Tóquio, Japão.

O mérito, porém, não é uma prerrogativa paulistana. Entre os cerca de 4 mil aeroportos avaliados, os internacionais de Porto Alegre (87,6%) e Curitiba (87,4%) aparecem nas 17ª e 20ª posições no grupo dos pequenos terminais. Entre os de médio porte estão Congonhas, na 6ª posição (87,8%); Brasília, em 13º (85,5%);  Rio de Janeiro – Galeão, em 20º (83,5%).

A segunda parte do relatório abrange as cias aéreas. Entre as 20 mais pontuais, a Azul está em terceiro, com 91%, e a Tam, em sétimo, 89,5%. No ranking especialmente dedicado às low cost (LCC Category), porém, a Azul surpreende. Sagra-se como a cia de baixo custo mais pontual do mundo, (91%), seguida pela Gol, em terceiro (86,4%), e Avianca, na 9ª posição (83,9%). Em suma, as quatro principais empresas aéreas brasileiras ficaram entre as seis transportadoras mais pontuais da América Latina em 2015.

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A constatação de que aéreas e aeroportos brasileiros estão entre mais pontuais do mundo pode até surpreender boa parcela dos brasileiros, mas, conforme relato da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR), vem, ano após ano, consolidando-se como uma realidade. Dados do Panorama ABEAR 2014, divulgado em julho do ano passado, já havia demonstrado como as aéreas brasileiras, por exemplo, são comparativamente mais pontuais que as concorrentes americanas.

Na ocasião, o levantamento confrontou os indicadores registrados pelos organismos oficiais brasileiros com os dados publicados pelo United States Department of Transportation – DOT, órgão de governo, regulador da atividade nos EUA. As principais aéreas brasileiras obtiveram à época o índice de pontualidade de 85% nos voos domésticos, considerando partidas realizadas em até no máximo 15 minutos depois do horário programado. Percentual superior aos 78% contabilizados pelo Departamento de Transporte dos EUA para as empresas norte-americanas, pelo mesmo critério de análise.

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Em outro estudo, da norte-americana Flight Stats, também especializada em métricas e estatísticas de transporte aéreo, a pontualidade brasileira também ganhou notoriedade. O relatório 2015 On Time Performance Service Awards Data, que reúne as maiores e mais importantes cias aéreas do mundo, enumera a TAM como sétima área mais pontual do mundo e a Avianca, como a décima. No recorte regional (América Latina), excetuando as Low Cost (Gol e Azul, por exemplo) TAM e Avianca estão respectivamente em segundo e terceiro lugar.

A Flight Stats ainda destaca os aeroportos Salgado Filho (Porto Alegre), Afonso Pena (Curitiba) com índices “Airport Departures” (pontualidade na decolagem) acima de 85%.

 

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Flight Stats – Aéreas Internacionais mais pontuais em 2015 na América Latina (exceto  Low Cost, como Gol e Azul, avaliadas em ranking específico)

 

O aumento na pontualidade dos voos, evidenciado pelas agências internacionais, vem se refletindo aqui, nos últimos anos, nas operações especiais de feriados. No balanço parcial da “Operação Carnaval 2016”, referente aos voos  nos sete aeroportos mais movimentados do País, de 4 e 10 de fevereiro , o índice de pontualidade alcançou 93,1% dos 9.473 voos programados. Na última “Operação Fim de Ano”, como é chamado o esquema especial voltado à alta demanda de passageiros do Natal e Réveillon, os quinze aeroportos mais movimentados do Brasil registraram a melhor média dos últimos nove anos: 91,9% de pontualidade. Das 55.673 decolagens, realizadas de 10 de dezembro a 10 de janeiro, apenas 8,1% dos voos partiram com atraso. Percentual de desempenho recorde da série histórica iniciada em dezembro de 2007, quando o atraso chegava a – hoje, inimagináveis – 30% das partidas realizadas.

Mas o que mudou, desde então? O que vem alçando os índices de pontualidade dos voos no país a esse cenário de destaque internacional?

Para o diretor de Segurança e Operações de Voo da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR), Ronaldo Jenkins, em declaração divulgada à época do lançamento do estudo da OAG, mais do que o desempenho de uma ou outra companhia, ou de um ou outro aeroporto em listas estatísticas, o que fica evidente para a atividade é o resultado consolidado. “As circunstâncias que afetam a pontualidade podem variar para cada companhia em razão do tipo de serviço, composição da frota, meteorologia das bases de atuação, tráfego nas rotas operadas, capacidade e qualidade dos aeroportos envolvidos. Mas quando olhamos para o conjunto das informações e vemos tantas companhias brasileiras e aeroportos nacionais em posições de destaque na comparação com concorrentes fortes e tradicionais, isso nos mostra que o trabalho tem caminhado no sentido correto.”

Jenkins elencou o “o trabalho colaborativo com o Centro de Gerenciamento de Navegação Aérea (CGNA), o aperfeiçoamento dos processos de embarque de passageiros, além das ações preventivas tomadas para os períodos de maior fluxo de passageiros nos aeroportos, como Carnaval, feriados prolongados e fim de ano entre as ações que colaboraram para os resultados.”

 

Ainda a respeito da pontualidade nos voos no País, o diretor do Departamento de Gestão Aeroportuária da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, Paulo Henrique Possas, destacou os resultados recentes como símbolo do patamar de qualidade das operações do setor. “Os índices de pontualidade da Operação Fim de Ano, que é exatamente um momento de alta demanda, mostram que o desempenho dos nossos aeroportos não só batem recordes nacionais como superam marcas de importantes terminais do mundo. É um reconhecimento do trabalho que companhias aéreas, gestores, operadores e governo vêm fazendo de maneira cada vez mais integrada”, concluiu.

Para o chefe do Centro de Gerenciamento de Navegação Aérea (CGNA), Tenente Coronel Aviador Luiz Roberto Barbosa Medeiros, desde a criação da unidade – subordinada ao Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) – em 2007, o Brasil vem consolidando posição de vanguarda no gerenciamento de fluxo de tráfego aéreo, não se limitando a investimentos em equipamentos e novas instalações, mas enfatizando ações de capacitação especializada.

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Salão Operacional do Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea – CGNA/DECEA. Monitoramento e gestão dos fluxos de tráfego aéreo e balanceamento capacidade x demanda 24 horas por dia. (Foto: Fábio Maciel)

Até mesmo em face aos eventos internacionais que o País vem hospedando desde 2012 (Rio + 20, Copa das Confederações, Jornada Mundial da Juventude, Copa do Mundo e, agora, Olimpíadas), a organização vem focando no treinamento altamente especializado de pessoal com ações de benchmarking e intercâmbios internacionais, incorporando com eficiência e flexibilidade o que há de mais moderno e eficaz no mundo referente à gestão dos fluxos de tráfego aéreo.

Ações como a implantação da Célula de Coordenação e Decisão, onde representantes de cias aéreas, administradores de aeroportos e outras organizações da aviação mantém posto permanente dentro do CGNA para agilizar procedimentos operacionais, por meio de um processo de decisão colaborativa e a adoção de ferramentas e sistemas focados em gerenciamento de fluxo aéreo, como o Sistema Integrado de Gestão de Movimentos Aéreos (SIGMA) também são enfatizadas pelo oficial. “O DECEA, por meio do CGNA, viabilizou uma integração das organizações atuantes no transporte aéreo que não havia dez anos atrás (…) A iniciativa do CGNA junto à indústria objetiva a melhoria do gerenciamento de fluxo de tráfego aéreo por meio de um maior intercâmbio de informações, contando com a participação de todos os envolvidos”, afirmou.

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Sala Master de Comando e Controle, implementada para integrar e agilizar as operação das organizações do transporte aéreo ao longo dos grandes eventos internacionais sediados no País. (Foto: Fábio Maciel)

Dado de realidade, endossado pelos números, os voos no Brasil estão muito mais pontuais. E, como se vê, começam a conduzir o País ao topo de rankings estatísticos, o que certamente surpreende muitos brasileiros.

Isso porque a percepção coletiva ainda está associada a experiências do passado quando o transporte aéreo encarava uma realidade completamente distinta. Hoje, agências internacionais independentes começam a revelar os resultados positivos de iniciativas bem-sucedidas. Cada vez mais perceptíveis entre os usuários do transporte aéreo, espera-se, que esses resultados de performance surpreendam também cada vez menos os brasileiros no futuro. Porque, com a licença do trocadilho, no ano que passou, a pontualidade britânica sobrevoou longe de Buckinghan. Veio pousar aqui. Pra brasileiro ver.

 

Daniel Marinho
Jornalista